terça-feira, 31 de maio de 2011

Insólito kafkiano

Hoje deparei com a Metamorfose numa livraria e não resisti.
Afinal, é uma leitura que já devia ter feito e que me vai, decerto, dar uma luzes fantásticas...

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Citação do dia

Hoje há várias citações memoráveis. Mas escolho esta, porque me diverti a ler o que Umberto Eco escreveu sobre a surpresa de ter verificado, depois de ter reescrito uma das suas obras numa língua que dominava mal (inglês), que essa versão era melhor que a original, redigida na sua língua materna:

«Sabe-se que a Art poétique de Verlaine diz “prends l’éloquence et tords lui son cou”, e conhecemos o apelo de Flaubert para que o génio se realize através de uma certa bêtise. Escrever em outra língua significa conquistar a “estupidez”, que é o propósito a que o estudioso deve visar.»

U. Eco, Conceito de Texto

1983 vs 2009

Uma das minhas dificuldades permanentes: decidir se o que estou a ler é relevante, apesar das décadas que já tem (tantos são os autores incontornáveis...) ou está ultrapassado e deve ser substituído por um ponto de vista mais actual.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Não ver, para não descrer

Tenho medo de abrir o ficheiro em que comecei a escrever o primeiro capítulo. O mais provável é ler aquelas palavras como quem acaba de acordar de um sonho em que tudo parecia maravilhoso, mas não tem nadinha que ver com a realidade.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

I&E

Investigar e ensinar é o binómio que se impõe a qualquer docente do ensino superior. Difícil mas necessária ginástica que implica publicar x artigos por ano e ao mesmo tempo ter uma carga lectiva que justifique o ordenado. Claro que a melhor solução de compromisso é encontrar formas de investigação que se apoiem na prática lectiva, para que o tempo dedicado a cada actividade seja simultaneamente despendido em proveito da outra. E quais são os professores que podem conciliar de forma tão prática e eficaz as faces da sua vida profissional? Muito poucos, eu diria. Mas tenho colegas que conseguem fazê-lo - ensinam e investigam, por exemplo, na área da metodologia do ensino das ciências.
Invejo-os por isso.
Mas continuo a gostar da minha vida, do meu trabalho, da minha investigação. Não se pode ter tudo e o que eu tenho já é imenso!

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Citação do dia

  «A literatura é, e deve ser, um veneno ministrado sabiamente; uma arte de prestidigitador, capaz de, com elegância ou com violência, levantar um sujeito acima do chão, ou tirar-lhe, como quem tira um tapete, o chão de debaixo dos seus pés; e a literatura não tem obrigação alguma de conservar o sujeito no ar, em qualquer dos casos: a intencionalidade da literatura consiste mesmo em suspender a acção mágica e em deixá-lo cair, perplexo e perdido, de quanto mais alto melhor.»

Jorge de Sena, "Amor da Literatura" (in O Reino da Estupidez: I)


Estás perdoado, Sena!

Kundera, Eco, Sena, tudo à mistura

Espera aí, Eco, que eu já te atendo. Sei que tens andado da mesa-de-cabeceira para o escritório e do escritório para a mesa-de-cabeceira, mas és boa companhia - animado e alegre, vivo e irónico - e é por isso que ainda não te despachei por completo. Ou queres voltar para a prateleira?
Olá, Kundera, há muito que andava para pegar em ti. Gostei do teu estilo simples, reiterado, quase oral. Gosto da tua vertigem, do teu mergulho constante nas insondáveis (afinal não tanto quanto isso) profundezas do ser(-se) humano. E é tão bom poder ler um romance que também é leitura académica! Mas o romance é ideal para ler à noite, na cama (melhor do que as tuas conferências, Eco, não desfazendo, se é possível). Por isso, Kundera, deixo-te por agora, na página 89, e volto a ouvir-te mais logo, se não te importas.
Como estás, Sena? Confesso que não tinha muita vontade de dialogar contigo, embora alguma curiosidade, porque detestei ler o Físico Prodigioso (a culpa não devia ser tua, mas da idade em que o li). Tinha curiosidade, sobretudo, porque o livro em que agora pego tem por título O Reino da Estupidez. Só me interessa, em princípio, um dos ensaios, mas detenho-me, para já, no prefácio. Parece-me relevante, começo a transcrever passagens... e alto. Eis que me vejo a descompreender progressivamente a tua prosa, como se de repente começasse a ficar cada vez mais pitosga, até deixar completamente de ver.
Interrompo para marcar uma consulta de oftalmologia, porque isto me recorda que preciso realmente dela. E pode ser que me ajude a perceber-te melhor, sabe-se lá. A ti e aos outros, já agora. Só o Kundera, no meio disto tudo, se pode ler quase às cegas. Abençoado seja!

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Desisto

Desisto, abdico de um dos meus orientadores.
Tenho dois, posso-me dar a esse luxo.
Não me liga, não me dirige palavra quando me vê, não quer saber de mim nem do meu trabalho, é como se eu não existisse. Não merece o nome de orientador, nem mesmo de co-orientador.
A partir de hoje, faço eu também de conta que ele não existe. Se não tem servido para nada mesmo!...
Entre ter dois cães de guarda, um que adormece em serviço e outro que passa todo o tempo a pavonear-se para as cadelas verem e os outros machos o invejarem, mais vale ficar só com o primeiro. Sempre guarda melhor a casa, quando está acordado, e é menos um a comer.

Lado bom

Lá fui gravar o filme promocional do curso de doutoramento da faculdade. Tinha uma maquilhadora à minha espera e tudo! Gravei três vezes, para garantir que alguma coisa se aproveita. Falei dos aspectos positivos do curso, omiti os negativos. Muito diplomático e lisonjeiro da minha parte, sem dúvida. Teatro? Não, apenas um dos lados da experiência. Mentira? Nada disso, simples omissão. Vira-casaquismo? Talvez. Tinha dito que não o faria, porque não tinha nada de bom a dizer. E disse.
Vá, batam-me!

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Olá e adeus

Fui à faculdade para mais uma aula do curso de estudos avançados.
No pátio, à minha frente, vejo caminhar a minha orientadora, que não me vê. Salto para o pé dela, a cumprimentá-la. Prazer em vê-la, blá-blá-blá. De imediato me ocorre: ela vai perguntar como está o trabalho e é preciso responder! Mas ela desfaz-se em desculpas por não ter combinado ainda comigo uma reunião. Explico-lhe que ando a fazer leituras e que ainda me falta escalar uma montanha de livros. Então ela sorri, totalmente compreensiva, e parece aliviada: então ficamos para Junho!
Despedimo-nos. Ficamos para Junho.
Por um lado é um alívio também para mim, mas por outro nem tanto. Gosto de espaço e de tempo, mas preciso de exigência, de vigilância constante.
Um orientador deve ser como uma espécie de cão de guarda, sempre alerta e em cima do acontecimento. Se adormece em vez de fazer rondas constantes à casa, não podemos confiar inteiramente nele...

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Mudar de livro

Mudar de livro é sempre bom. É sinal de que estamos a avançar, a progredir. Mas há livros que deixam pena quando os fechamos, mais ainda quando os devolvemos à biblioteca que no-los emprestou. São livros velhos a quem poucos dão valor. Estão desactualizados, claro. Por isso, lá vão eles calar-se humildemente, ficar de novo quietos, num longo sono de subaproveitamento.
Despeço-me deles quase como de alguém. Momentos antes de os entregar, folheio-os ainda mais uma vez, passo os olhos por linhas ao acaso, à procura de mais uma frase sonante, como aquelas pessoas que lançam um último grito em direcção ao vale, do alto da montanha, antes de lhe virarem costas, para que o eco se faça ouvir enquanto descem.
Adeus, tem de ser, são horas - é como o acabar de uma conversa.
Ponho um ponto final no meu diálogo silencioso com o Jacinto (do Prado Coelho) e inicio outro com o Eduardo (Lourenço). Como está, passou bem?

quinta-feira, 12 de maio de 2011

Cedi

Estas leituras enervam-me. - A causa, o motivo, ou uma desculpa?

O principal é que fui vencida pela minha fortíssima fraqueza e cedi.

Fui às batatas fritas.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Página 4

Pode ser para deitar fora, pode ser para manter. Não faço ideia. Mas vou escrevendo, à medida que as ideias surgem. Com medo que desapareçam para nunca mais voltarem.

Ingarden e eu

Decididamente, Roman Ingarden e eu não nos entendemos.
Ele não responde às minhas perguntas e eu não percebo nadinha do que ele diz.


Serei só eu?
Façam-me o favor de ler isto:


Segundo Ingarden, a obra literária é constituída por vários estratos heterogéneos, nomeadamente os seguintes:



a) o estrato das formas significativas verbais e das produções fónicas de grau superior erguidas sobre elas;
b) o estrato da unidades de significação de diverso grau;
c) o estrato de múltiplos aspectos esquematizados, das continuidades e séries de aspectos;
d) o estrato das objectividades apresentadas e seus destinos; este último estrato, duplo, divide-se em correlatos das frases intencionais apresentativas e objectividades neles apresentadas e seus destinos.


Ora, é impressão minha ou isto é incrivelmente vago, absurdamente ambíguo, estranhamente abstracto?
Sinto-me completamente estúpida. Ou então escandalosamente gozada.


Desculpem o desabafo!


sexta-feira, 6 de maio de 2011

Incredulidade

Será possível que eu já esteja na página três de um texto minimamente aproveitável enquanto esboço do que virá a ser uma... tese?

Sentimentos ambivalentes

O coordenador do departamento pede-me que preste um depoimento, a gravar em vídeo, para promover os cursos de doutoramento num filme promocional da faculdade. Logo a mim! Tive vontade de lhe enviar o link deste blogue. Em vez disso, fui sincera ao ponto de responder assim ao seu e-mail: «Resta saber se a faculdade está interessada em divulgar o meu depoimento... essa é que é a grande questão.» E ele foi igual a si próprio, arguto e superior a provocações: queria crer que a faculdade estaria interessada em conhecer a minha opinião, qualquer que ela fosse, mas num vídeo promocional naturalmente não seria muito sensato divulgar as que fossem menos agradáveis; que não queria que eu me esquivasse de dizer o que realmente penso, por isso obrigada na mesma e até uma próxima.
Mais tarde, em amena conversa pessoal, dei-lhe uma ideia do que pensava e ele compreendeu e está de acordo. Sabe muito bem que as coisas têm de melhorar. Mas não encontra ninguém disponível para fazer o tal depoimento... Acabei por ficar com vontade de ajudar. Combinámos que eu direi o que entender, mas já não sobre o curso específico, antes sobre a importância de fazer um doutoramento na área. Simples e eficaz. Porém, como é evidente, muito afastado do objectivo inicial. Seja.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Tentação e medo

Tentação de saltar já para a conclusão.
Medo de, se o fizer, não ler mais nada do que fica para trás.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Citação do dia

«o paradigma filológico dirá inevitavelmente: estuda-se uma obra em tudo o que nela é estudável, e o resto é beleza, e da beleza nada há a dizer; basta fruir. Mas a beleza é o sexo: origem sexual da beleza, como Freud pretende. E o sexo perverte a serenidade do estudo.»
Eduardo Prado Coelho, Os Universos da Crítica


Sem comentários...

terça-feira, 3 de maio de 2011

Citação do dia


«A formação do gosto faz-se através da família e da escola – embora não exclusivamente. Mas, para que essa formação seja eficaz, é necessário que ela surja no interior do sujeito como o produto da sua capacidade de «sentir, pensar e julgar pela sua cabeça». Trata-se de naturalizar o arbitrário. E para isso é imperioso que, como diz Bourdieu, a inculcação do arbitrário se faça pela ocultação do arbitrário da inculcação.» 

Eduardo Prado Coelho, Os Universos da Crítica

Mar imenso

O livro que tenho pela frente é um mar imenso que não consigo, nem conseguirei, abarcar na totalidade. Resigno-me a viajar nele e a tentar colher, nas várias viagens que vou fazendo, o melhor que ele me pode oferecer e que eu sei aproveitar. Mergulho às vezes, quando me sinto capaz de adaptar o corpo à temperatura da água. Abro os olhos e vislumbro o fundo, lá longe. Nessas ocasiões, sinto-me feliz e realizada, ainda que por escassos momentos. A maior parte das vezes, olho-o da superfície e contemplo as suas maravilhas. Vou absorvendo os tons, captando as ondulações, tentando em vão decorar linhas, texturas que apanho com mais facilidade, porque a luz e o meu estado de espírito assim mo permitem. Tiro fotografias incessantemente, procurando registar todos os aspectos que sei que me escapariam por completo, se não o fizesse. Cada gota representa algo diferente e único.
Este mar imenso assusta, intimida, mas encanta e seduz. E a solidão em que me vejo nele ajuda a percebê-lo melhor. Ou talvez apenas a sentir-me mais próxima dele. Mas mais perdida, nos dias piores.

segunda-feira, 2 de maio de 2011